O Assentamento de Exu – como funciona é um tema importante dentro da cultura afro-brasileira. Neste artigo, você descobrirá a definição, a história e a importância desse assentamento. Além disso, vamos explorar os rituais, as oferendas e os mestres que fazem parte desse universo. Você aprenderá também como integrar essas práticas na sua vida e a relevância do assentamento para exú. Prepare-se para uma jornada fascinante!
Introdução
O assentamento de Exu é um dos temas mais relevantes e complexos dentro das religiões de matriz africana no Brasil, em especial na Umbanda, na Quimbanda e no Candomblé. Exu é uma das figuras centrais dessas tradições, sendo reconhecido como guardião dos caminhos, mensageiro entre os homens e os orixás, senhor da comunicação e das trocas, e também como uma divindade que representa o movimento, a transformação e a vitalidade da vida.
Dentro das tradições afro-brasileiras, tudo inicia com Exu. Nenhum ritual se abre sem antes saudá-lo, nenhum pedido chega aos orixás sem antes passar por sua mediação. Ele é a chave que abre as encruzilhadas, o dono das passagens e o responsável por garantir que a energia flua corretamente entre os mundos. Por isso, o assentamento de Exu não é apenas um ponto físico no espaço: ele é um fundamento espiritual que estabelece conexão entre o mundo material e o espiritual, garantindo a presença e a atuação constante dessa força.
Infelizmente, há muita confusão em torno do termo “assentamento”. Em alguns textos superficiais, o conceito foi reduzido à ideia de “terra” (como se fosse apenas um pedaço de chão delimitado) ou de um “altar improvisado”, quando na realidade trata-se de um complexo fundamento ritualístico e sagrado, cheio de simbolismos, regras e segredos que variam de casa para casa, mas que sempre mantêm em comum o objetivo de fixar e ancorar o axé de Exu.
Autores como W. W. da Matta e Silva alertam que o assentamento não deve ser visto como um objeto decorativo, mas como um verdadeiro pacto energético entre o médium, a comunidade e a entidade. Já Norberto Peixoto ressalta que o assentamento é um ponto de poder que exige respeito e responsabilidade, pois nele se concentra a força de uma entidade viva que atua em constante comunicação com o plano espiritual.
Assim, compreender o assentamento de Exu é compreender também a essência das religiões afro-brasileiras: o diálogo entre mundos, a preservação da ancestralidade e a vivência do sagrado no cotidiano. Neste artigo, vamos explorar sua definição correta, sua história, diferenças em relação a outras práticas (como tronqueira e firmeza), seus rituais, oferendas e, por fim, a sua importância não apenas no plano espiritual, mas também na vida comunitária e cultural de seus praticantes.
O que é o Assentamento de Exu?
O assentamento é um ponto de fixação de energia. É um espaço sagrado preparado para que a força de Exu seja ancorada na Terra. Ele é feito com elementos materiais (pedras, ferro, bebidas, ervas, sangue de sacrifício em alguns casos) que servem como veículo físico para sustentar o axé da entidade ou do orixá. Não se trata de mera simbologia: é um lugar de potência espiritual e transformação energética.
Adérito Simões, em Exu – O Guardião da Humanidade, explica que “o assentamento é a materialização de um vínculo entre o médium, o terreiro e a entidade”. Ele difere de um simples altar porque não é apenas representativo: ele é funcional e opera como uma base energética permanente.
Funções principais do assentamento:
- Abrir e guardar caminhos: Exu, como senhor das encruzilhadas, garante que os caminhos estejam protegidos e livres de demandas.
- Proteção espiritual: cria um campo de defesa em torno do médium, da casa e da comunidade.
- Comunicação: estabelece uma linha direta de comunicação com o mundo espiritual.
- Fixação da entidade: é onde Exu “firma o pé” no mundo material, possibilitando sua atuação.
- Sustentação do axé: mantém a energia viva, renovando-se por meio de oferendas regulares.
Exu assentado é, portanto, Exu presente. Sem esse fundamento, sua atuação se torna mais volátil e passageira. Quando assentado corretamente, ele atua com constância, proteção e clareza.
Diferença entre Tronqueira, Firmeza e Assentamento
Esses três conceitos são muitas vezes confundidos, mas possuem funções distintas dentro das casas de culto:
- Tronqueira: é a porta de proteção de um terreiro. Fica geralmente do lado de fora ou logo na entrada, servindo como ponto de guarda coletivo. Exu, neste caso, protege o espaço contra espíritos e energias negativas que tentam adentrar.
- Firmeza: refere-se a um ponto individual, muitas vezes em casa, onde o médium “firma” sua entidade com velas, bebidas ou símbolos. É um recurso temporário, usado para reforçar a conexão e pedir auxílio imediato, mas não substitui o assentamento.
- Assentamento: é o ponto fixo, definitivo, preparado ritualmente com fundamentos específicos para ancorar a energia de Exu de forma contínua e permanente 【23†BC04】.
Norberto Peixoto resume bem essa distinção ao afirmar que o assentamento é um “contrato energético” entre o praticante e a entidade, enquanto a firmeza é um ponto de contato temporário e a tronqueira é um guardião coletivo da comunidade.
História e Origem do Assentamento de Exu
Na África, especialmente entre os povos iorubás e bantos, o culto a Exu já envolvia pontos fixos de veneração, conhecidos como ibás ou assentamentos. Exu, chamado Elegbara, era cultuado com pedras, búzios e símbolos fálicos que representavam sua energia vital e seu poder de transformação. Ele estava presente nas encruzilhadas, nas entradas das aldeias e nos mercados, sempre associado ao movimento e à comunicação.
Com a diáspora africana e a escravidão, esses fundamentos foram recriados no Brasil. No Candomblé, os assentamentos (ibás) são mantidos com rigor e sigilo, sendo a base da relação com cada orixá. Na Umbanda, embora a forma tenha se transformado, o princípio continua: Exu deve ser assentado para proteger, comunicar e abrir caminhos. Já na Quimbanda, os assentamentos assumem uma feição ainda mais central, pois toda a prática gira em torno do trabalho com Exus e Pombagiras, exigindo rituais mais intensos e voltados diretamente para essas entidades.
Pierre Verger, em Orixás: Deuses Iorubás na África e no Novo Mundo, afirma que “não há culto sem fundamento material, pois é no objeto sagrado que o axé se fixa”. O assentamento, portanto, é uma herança direta das tradições africanas reatualizadas no Brasil, um elo de continuidade com os ancestrais.
Elementos do Assentamento de Exu
O assentamento pode variar muito conforme a casa, a tradição e o Exu em questão. Porém, alguns elementos são recorrentes e fundamentais:
- Pemba: utilizada para riscar os pontos sagrados.
- Ferro ou tridente: símbolos da força de Exu e de sua atuação nos caminhos.
- Pedras ou otás: receptáculos do axé.
- Bebidas: cachaça, marafo, vinho tinto, que alimentam e agradam Exu.
- Ervas: folhas específicas para limpeza, abertura de caminhos e defesa 【35†BC16】.
- Sangue (no Candomblé e Quimbanda): vitaliza o assentamento através do sacrifício.
- Charutos e fumo: ligados ao prazer e ao poder de comunicação de Exu.
Cada elemento é escolhido não por gosto pessoal, mas por correspondência simbólica e energética. Como lembra W.W. da Matta e Silva, “na Umbanda, tudo é fundamento, nada é enfeite”.
Oferendas e o Padê de Exu
As oferendas são parte fundamental do assentamento. Elas alimentam, fortalecem e renovam a energia de Exu. Sem elas, o assentamento perde sua vitalidade.
Tipos de oferendas comuns:
- Alimentos: farofa de dendê, carne, milho, frutas.
- Bebidas: cachaça, vinho, cerveja.
- Objetos: moedas, chaves, punhais, ferramentas de ferro.
- Fumo: charutos e cigarros.
O ritual mais tradicional é o Padê de Exu, preparado geralmente com farinha de mandioca ou de milho, azeite de dendê, mel e bebidas alcoólicas. Este ritual, descrito tanto na Umbanda quanto no Candomblé, é considerado essencial para “abrir os trabalhos”, garantindo que Exu esteja alimentado e apto a permitir a comunicação com os demais orixás 【23†BC04】.
Funções Espirituais do Assentamento
O assentamento de Exu possui várias funções espirituais, que podem ser resumidas em quatro principais:
- Proteção: funciona como escudo energético contra ataques e demandas.
- Abertura de Caminhos: facilita oportunidades, negociações e realizações.
- Comunicação: estabelece ligação entre o humano e os orixás.
- Equilíbrio: promove harmonia entre forças positivas e negativas.
Essas funções são reforçadas por meio da regularidade das oferendas e do respeito às tradições. Como afirma Reginaldo Prandi em Mitologia dos Orixás, “Exu é a própria energia do movimento; se ele não é cuidado, os caminhos se fecham”.
Relações Simbólicas de Exu
O assentamento também está carregado de simbolismos:
- Chaves: abertura e fechamento de caminhos.
- Encruzilhadas: ponto de encontro e decisão.
- Fogo: transformação e vitalidade.
Na relação com outros orixás, Exu é sempre o primeiro. Sem ele, nenhum ritual se inicia. Ele abre para Ogum guerrear, leva recados a Xangô, permite o contato com Iemanjá. Assim, o assentamento de Exu nunca está isolado; ele dialoga com toda a estrutura espiritual da casa.
O Papel Comunitário do Assentamento
Além de sua função espiritual, o assentamento de Exu tem grande valor comunitário. Ele é o ponto de união da comunidade religiosa. Quando os médiuns e frequentadores participam das oferendas e dos rituais, reforçam os laços de identidade, pertença e solidariedade.
Vicente Galvão Parizi, em O Livro dos Orixás, observa que “os assentamentos não são apenas pontos de força, mas também pontos de memória”. Eles guardam a história, a fé e a resistência de um povo que enfrentou séculos de preconceito e perseguição.
Considerações Finais – Versão Expandida
O assentamento de Exu é um dos fundamentos mais profundos e centrais dentro das religiões afro-brasileiras. Não se trata de um mero enfeite, de uma decoração ritual ou de um improviso simbólico: é uma estrutura viva, portadora de axé, que ancora a energia de Exu no mundo material e permite que sua força atue de maneira constante e efetiva.
Esse ponto sagrado é, ao mesmo tempo, altar, portal e guardião. É nele que Exu se fixa, tornando-se presença atuante na vida do indivíduo, da casa de culto e da comunidade. Através do assentamento, a comunicação com Exu se estabelece com maior clareza; a proteção espiritual se intensifica; os caminhos se abrem e se mantêm livres de demandas; e a vida cotidiana se torna permeada pela força transformadora do movimento, da comunicação e da vitalidade que Exu representa.
Quando olhamos para a prática do assentamento, percebemos que ela não é apenas um rito religioso, mas também uma expressão cultural e histórica. Cada assentamento carrega consigo marcas da tradição ancestral africana, reelaboradas no Brasil pelos povos escravizados que, mesmo em condições adversas, preservaram suas divindades e fundamentos. Como lembra Pierre Verger, o fundamento material é indispensável para a manifestação do axé. Nesse sentido, o assentamento de Exu é também um monumento de resistência e continuidade cultural.
Além da função espiritual, o assentamento possui um papel comunitário indispensável. Ele é o ponto de coesão da casa, o local que fortalece a união entre os médiuns, frequentadores e a entidade que guarda o espaço. Ele une, protege, ensina e orienta. Vicente Galvão Parizi destaca que os assentamentos são igualmente pontos de memória: guardam a história de um povo e de sua religiosidade. Assim, cada vez que uma oferenda é realizada, cada vez que um cântico é entoado diante do assentamento, está se renovando não apenas a energia de Exu, mas também a ligação entre passado, presente e futuro.
Respeitar e cuidar de um assentamento é, portanto, uma forma de honrar Exu, mas também toda a ancestralidade que o acompanha. Esse cuidado se expressa tanto no zelo com as oferendas e rituais quanto na reverência interior, no reconhecimento da sacralidade que ali se manifesta. Exu não é apenas um guardião individual, mas também coletivo: seu assentamento sustenta a comunidade, garante a ordem espiritual do espaço e abre os caminhos para que o axé circule de maneira equilibrada.
Compreender o assentamento de Exu é mergulhar na essência das religiões afro-brasileiras. É reconhecer que o sagrado não está distante, mas presente, fixado, vivo em pontos concretos de poder. É entender que espiritualidade e cultura se entrelaçam, formando uma rede de significados que sustenta tanto a prática ritual quanto a vida social.
Portanto, estudar e valorizar o assentamento de Exu é mais do que um exercício de fé: é um ato de resistência cultural, de preservação da ancestralidade e de afirmação da identidade de um povo. Quando cuidamos de um assentamento, cuidamos também da nossa própria conexão com as raízes espirituais que sustentam a Umbanda, o Candomblé, a Quimbanda e demais tradições afro-brasileiras.
Exu, assentado, nos ensina que tudo se move, que nada é estático, que a vida é feita de caminhos e encruzilhadas. Honrá-lo nesse fundamento é honrar o movimento da vida, a comunicação que aproxima mundos e a ancestralidade que nos guia. Ao final, compreender e respeitar o assentamento de Exu é compreender e respeitar a própria espiritualidade afro-brasileira em sua plenitude.
Orientações Práticas ao Leitor
Para aqueles que desejam se aprofundar nesse fundamento, algumas recomendações importantes:
- Estudo contínuo: Busque obras de referência como Pierre Verger, Reginaldo Prandi, W.W. da Matta e Silva e Norberto Peixoto. Cada leitura acrescenta camadas de compreensão sobre Exu e seus fundamentos.
- Vivência comunitária: Participe de rituais em terreiros sérios e comprometidos. A teoria se completa na prática, e a experiência direta é insubstituível.
- Respeito ao segredo: Nem tudo é revelado em livros ou textos. Muitos fundamentos são transmitidos apenas de pai para filho de santo. Respeitar esse sigilo é também respeitar Exu.
- Zelo com oferendas: Se você já cultua Exu, dedique-se a manter o assentamento limpo, cuidado e alimentado. O descuido enfraquece a energia.
- Consciência cultural: Lembre-se de que o assentamento não é apenas um fundamento religioso, mas também um patrimônio cultural afro-brasileiro. Trate-o como tal.
Essas orientações ajudam o praticante ou estudioso a se aproximar de Exu com respeito, consciência e responsabilidade. Afinal, como ensinam os mais velhos, “quem cuida de Exu, tem sempre os caminhos abertos”.

Pai José de Aruanda é um espiritualista dedicado ao estudo e à prática das energias de Exu e Pombagira. Com anos de experiência no culto e na vivência dessas entidades, ele compartilha seu conhecimento com o intuito de desmistificar e honrar a força desses orixás. Seu trabalho busca proporcionar um entendimento profundo sobre as culturas e tradições afro-brasileiras, transmitindo sabedoria ancestral com respeito e autenticidade.